01 maio, 2011

Beatificação de João Paulo II


Da minha parte, lembro que foi João Paulo II que me chamou ao Episcopado em Agosto de 1981, três anos depois da sua eleição para sucessor de Pedro; foi ele que me enviou para Vila Real em 1987; e foi ele o Papa que eu visitei duas vezes na visita ad limina e com quem falei sobre Vila Real diante de um mapa de Portugal.Quem o afirma é D. Joaquim Gonçalves.

A beatificação é o penúltimo grau do processo de glorificação de alguém, sendo o último a canonização propriamente dita. Ao ser canonicamente declarado beato (abreviatura de «bem aventurado»), essa pessoa tem direito ao culto público restrito; pela canonização, esse culto alarga-se a toda a Igreja.

1. No próximo Domingo, dia um de Maio, será beatificado em Roma o Papa João Paulo II falecido em 2005, um contemporâneo nosso cuja voz e presença física ouvimos e vimos directamente em terras de Portugal. Essa nossa experiência directa até parece à nossa sensibilidade um obstáculo ao culto religioso, por encurtar a distância a que instintivamente colocamos os santos. Homem habitualmente bem disposto, e amigo de cantar com a assembleia, imaginamo-lo nesse dia a sorrir-nos do céu!

2. A beatificação é a inscrição oficial de alguém na lista dos que merecem ser apresentados como modelos de vida cristã e intercessores junto de Deus. A beatificação é o penúltimo grau do processo de glorificação de alguém, sendo o último a canonização propriamente dita. Ao ser canonicamente declarado beato (abreviatura de «bem aventurado»), essa pessoa tem direito ao culto público restrito; pela canonização, esse culto alarga-se a toda a Igreja. Tanto a beatificação como a canonização exigem a presença de um milagre como sinal do reconhecimento religioso do povo cristão e proclamação da fidelidade dessa pessoa à vontade de Deus.

Literalmente, canonização é «colocar dentro dos cânones», isto é, ver que a vida de alguém se enquadra no estado de vida a que se chama um santo: ter praticado em grau heróico as virtudes teologais da fé, esperança e caridade, e as virtudes morais da piedade, justiça, fortaleza e temperança. Todo o percurso da vida é examinado em pormenor por equipas de peritos em ciências teológicas e espirituais, incluindo os escritos doutrinários da pessoa a fim de verificar se a sua mentalidade sintonizava com a doutrina da Igreja ou se dela se afastava.

A canonização de homens e mulheres de todos os tempos e idades e condições sociais é a prova da vitalidade da Igreja nascida da acção criador do Espírito Santo que Jesus deu à sua Igreja. Se é permitido aproximar-nos da linguagem empresarial, diríamos que é uma espécie de produção de qualidade. Uma igreja sem santos seria uma Igreja falida. Os santos são todos diferentes, são os diversos tipos de humanidade transfigurados pela graça de Deus. São sarmentos da mesma cepa, frutos da vinha do Senhor, vivos da fé.

3. O acto litúrgico da beatificação só acontece depois desse longo processo jurídico. Não se trata propriamente de uma sentença de tribunal. A santidade é obra da graça de Deus e da fidelidade de cada um, e os peritos verificam somente os caminhos andados que são diferentes de pessoa para pessoa. Nessa verificação intervém um grupo incumbido de pôr em relevo as lacunas do candidato. Por isso se diz com humor cristão que «é mais fácil ir para o céu do que ir para o altar».Por disposição do Papa Bento XVI, o acto litúrgico da beatificação é feito na terra de origem do beatificado por um bispo nomeado pelo Papa, reservando-se o Papa para si os actos de canonização. No caso de João Paulo II, Bento XVI quis chamar a si a beatificação e fazê-la em Roma.

É habitual dar início ao processo de glorificação de alguém somente cinco anos depois da morte dessa pessoa. Isto para dissipar alguns entusiasmos momentâneos que restam da vida da pessoa e para não afectar positiva ou negativamente os parentes ainda vivos. A pedido da multidão e das súplicas de todo o mundo, a Santa Sé abriu uma excepção para dar início ao caso de João Paulo II, mas exigiu todos os outros pormenores do processo: a beatificação não é hoje fruto de uma mera aclamação popular. O espírito crítico do homem moderno não se coaduna com simples manifestações de sentimentalismo religioso.

Da minha parte, lembro que foi João Paulo II que me chamou ao Episcopado em Agosto de 1981, três anos depois da sua eleição para sucessor de Pedro; foi ele que me enviou para Vila Real em 1987; e foi ele o Papa que eu visitei duas vezes na visita ad limina e com quem falei sobre Vila Real diante de um mapa de Portugal. Essa proximidade física e estima revestem agora um rosto diferente, o rosto da veneração do culto oficial, e isso convida a outra atitude.

4. O Papa vai ser beatificado no tempo pascal. Ao terminar o segundo livro sobre Jesus de Nazaré, Bento XVI fala da ressurreição de Jesus como a passagem a um estado de vida totalmente diferente e superior, entrando na glória do Pai. Mas ao entrar nessa glória, Jesus não fugiu, não se ausentou do mundo, continua presente a todo o mundo. O Papa diz que a ressurreição lança uma nova luz sobre o mundo, e que essa luz se manifestará um dia totalmente ao mundo. Esse clarão de luz antecipa-se de algum modo com o aparecimento de alguns santos como S. Domingos e S. Francisco, Santa Teresa de Ávila, S. Inácio de Loiola e S. Francisco Xavier. Acrescentemos-lhes agora o Beato João Paulo II: a sua voz, o seu canto vigoroso, o seu olhar subtil, os ensinamentos dos seus escritos vêm agora acrescidos da luz da glória celeste. Tornam-nos mais brilhantes e fazem crescer a Páscoa.

D. Joaquim Gonçalves,

Bispo de Vila Real


1 comentário:

Anónimo disse...

Esta noite, ao acompanhar pela internet, em parte, a vigília de oração na véspera da beatificação do nosso Santo Padre João Paulo II. As lágrimas correram-me pela face e pude, de coração sincero, dar graças ao bom Deus por tão santo homem, Padre e Papa que viveu connosco uma boa parte das nossas vidas. Com todo o respeito e admiração pelo nosso actual Papa, Bento XVI, portador de outros carismas, João Paulo II foi, sem dúvida, o Papa da minha vida, o homem e cristão que mais me marcou e mais me levou a aproximar-me de Jesus Cristo, a conhecê-l'O, a amá-l'O tal como Ele é desde toda a eternidade. Foi com João Paulo II que eu pude ver, nitidamente, que Jesus Cristo não é um Homem e um Deus moldável a cada tempo e a cada homem em particular, mas é o Deus imutável, o Deus do Amor, o DEus de todos os homens, de todos os tempos e lugares, que se fez carne por nosso amor e para a nossa salvação.
Esta noite e amanhã é um grande dia de festa na Igreja Católica. Porque encerramos a oitava Pascal (mas a Páscoa continua até à manhã do Pentecostes e prolonga-se por todos os dias do ano litúrgico), é também o Domingo da Misericórdia, justamente instituído por João Paulo II, e o dia da beatificação do nosso Santo Padre João Paulo II. Demos Graças a Deus porque nos foi dada a graça de sermos peregrinos nesta Igreja e neste tempo.